29 agosto 2007

Uma daquelas belezas realmente agenciadoras.

Terry Eagleton- Ideologia: Uma introdução. pág. 13

"O estudo da ideologia é, entre outras coisas, um exame das formas pelas quais as pessoas podem chegar a investir em sua própria infelicidade. A condição de ser oprimido tem algumas pequenas compensações, e é por isso que às vezes estamos dispostos a tolerá-la. O opressor mais eficiente é aquele que persuade seus subalternos a amar, desejar e identificar-se com seu poder; e qualquer prática de emancipação política envolve portanto a mais difícil de todas as formas de liberação, o libertar-nos de nós mesmos. Mas o outro lado da história é igualmente importante. Pois se tal dominação deixar, por muito tempo, de propiciar suficiente gratificação a suas vítimas, então estas com certeza acabarão por revoltar-se contra ela. Se é racional acomodar-se a uma mistura ambígua de sofrimento e prazer marginal, quando as alternativas políticas mostram-se perigosas e obscuras, é também racional rebelar-se quando o sofrimento ultrapassa em muito as gratificações, e quando tal ação parece encerrar mais ganhos do que perdas.


A crítica da ideologia, portanto, supõe que ninguém jamais está inteiramente iludido - que aqueles que se encontram sob opressão alimentam, mesmo assim, esperanças e desejos que só poderiam ser realizados, de maneira realista, pela transformação de suas condições materiais. Se por um lado rejeita o ponto de vista externo da racionalidade iluminista, por outro compartilha com o Iluminismo essa confiança fundamental na natureza moderadamente racional dos seres humanos. Alguém que fosse totalmente vítima da ilusão ideológica sequer seria capaz de reconhecer uma reivindicação emancipatória sobre si; e é porque as pessoas não param de desejar, lutar e imaginar, mesmo nas condições aparentemente mais desfavoráveis, que a prática da emancipação política é uma possibilidade genuína..Não se
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trata de afirmar que os indivíduos oprimidos secretamente acalentam alguma alternativa pronta para sua infelicidade; significa que, uma vez que se tenham libertado das causas desse sofrimento, devem ser capazes de olhar para trás, reescrever suas histórias de vida e reconhecer que aquilo de que desfrutam agora é o que teriam desejado anteriormente, caso tivessem podido estar conscientes disso. Uma prova de que ninguém é, ideologicamente falando, um tolo completo, é o fato de que as pessoas ditas inferiores devem realmente aprender a sê-lo. Não é suficiente para uma mulher ou um colono serem definidos como uma forma de vida inferior: é preciso ensinar-lhes ativamente essa definição, e alguns deles revelam-se brilhantes bacharéis nesse pro­cesso. E surpreendente quão hábeis, engenhosos e perspicazes podem ser os homens e mulheres em provar para si mesmos que são incivilizados e burros. Em certo sentido, é claro, essa "contradição performativa" é a causa do desânimo político; nas circuns­tâncias adequadas, porém, trata-se de uma contradição que pode levar uma ordem dominante à ruína.

3 comentários:

Rebeca dos Anjos disse...

Interessante que sempre que leio algo relacionado ao comportamento humano, à vida em sociedade e à própria estrutura desta, enxergo como base o nosso instinto animal.

Animais que são mais fortes lutam pra vencer. Os mais fracos se escondem. Mas no final das contas, tudo é método pra sobreviver.

Ideologia é um meio poder. Os mais fortes lutam para usá-la ao seu favor e os mais fracos só acatam. Mas estão todos sobrevivendo.

Existem aqueles que não têm força pra serem ouvidos e mesmo assim não acatam. Esses usam a ideologia como motivação. Tenho a impressão de que esses vivem. E são mais racionais também.

Viajei pra cacete...rs!

Adorei o texto! Muito bom pra mim, que poucas vezes leio sobre esses assuntos...

Beijo grande!!!

O empírico disse...

Eita,lembrou-me Foucault...

1+1 é 2, mesmo?
(quem disse?)

(e quem acreditou?)

Anônimo disse...

Todo ser humano é dotado de poderes nem sempre idenificados por ele mesmo, ou por que quer que seja.
Cadinho RoCo